Bombas-relógio, previstas para explodir no futuro, distribuídas ao longo do caminho pelo vice-presidente e pela secretária de Estado mostram o presidente Obama, nos meses iniciais do primeiro mandato, já no olho do alvo de um movimento premeditado de desconstituição, aí posto pelos principais membros de seu gabinete.
Por Alexander Cockburn, para o CounterPunch Diary
No plano superficial, Obama comanda uma equipe indisciplinada de governo; num plano mais realista (e mais sinistro), enfrenta motim comandado por duas figuras políticas que, há menos de um ano, não faziam outra coisa além de dizer e repetir o quanto suas pessoais qualificações para ocupar o Salão Oval seriam infinitamente superiores às do jovem senador de Illinois.
O grande perigo para Obama, que se vê bem evidente nas bombas-relógio (a metáfora é boa, porque são bombas-relógio políticas, não diplomáticas), não é nem o ridículo nem a confusão no plano internacional sobre quais, afinal, são as políticas de governo dos EUA. O perigo está no massacre direto e claro de sua presidência, por um lobby israelense doméstico que já está tão absolutamente fora de controle que já expõe hoje como ridícula a pífia tentativa de Obama para deter as construções nas colônias palestinas – ou para conter as agressões israelenses por qualquer outro meio.
Vejam Joe Biden, para começar. Há três semanas, deu luz verde a Israel para bombardear o Irã; foi suavemente admoestado pelo presidente. Na hora, foi como mais uma gaffe, numa vida de gaffes mais ou menos cômicas, perpetradas com intuito de autopromoção, para obter vantagem política pessoal.
Há mais do que isso, como se viu depois; tudo é mais grave. Imediatamente depois de Obama voltar de Moscou, o ar ainda adocicado na esperança de uma nova era de confiança e cooperação, Biden embarcou para Ucrânia e Geórgia, onde disse a economia russa estaria "atrofiada"[1] e não teria futuro. Em Tbilisi, disse no parlamento georgiano que os EUA continuariam a ajudar a Geórgia a "modernizar" o aparato militar; que Washington "apoia integralmente" a aspiração da Geórgia a unir-se à Otan; e que ajudaria Tbilisi a alcançar os padrões da aliança. As declarações geraram reações furiosas de Moscou, que exigiram sanções contra qualquer Estado que trabalhe para rearmar a Geórgia[2].
A Geórgia é fator importante – e pode ser fator vital – no caso de Israel decidir atacar o complexo nuclear iraniano.
A rota aérea de Israel ao Irã é geograficamente e diplomaticamente complicada. Por sua vez, a Geórgia está magnificamente bem situada como base de decolagem para esse tipo de aventura. Israel há muito tempo está profundamente envolvida em processos para rearmar e treinar forças armadas georgianas. O presidente Saakashvili tem-se vangloriado de que seu ministro da Defesa, Davit Kezerashvili, e Temur Yakobashvili, ministro responsável pelas negociações sobre a Ossétia do Sul, viviam em Israel antes de mudar-se para a Geórgia; e acrescentou: "A paz e a guerra estão nas mãos dos judeus israelenses."
Nos calcanhares de Biden em trabalho de proxeneta em Tbilisi, a secretária de Estado Clinton, por sua vez, tomou o rumo da Tailândia, para encontro com líderes asiáticos. Lá, em programa de televisão & amenidades, disse que "contra um Irã nuclear os EUA podem ter uma 'defesa guarda-chuva'" (de fato um 'guarda-chuva' nuclear para cobrir Israel, Egito e Arábia Saudita).
O lobby israelense tem trabalhado muito, já há alguns anos, para promover a ideia de um guarda-chuva nuclear dos EUA. O principal caixeiro-viajante desse negócio sempre foi Dennis Ross, hoje encarregado da política de Obama para o Oriente Médio, no Conselho Nacional de Segurança.
Em campanha, ano passado, Clinton várias vezes ofereceu a ideia de um 'defesa guarda-chuva' como exemplo de iniciativa política que ela – mas não Barack Obama, noviço em questões de negócios externos – teria competência para fazer avançar.
Sob qualquer ponto de vista racional, o "guarda-chuva nuclear" é ideia escabrosa, que cheira à teologia da era da alta Guerra Fria e ao vocabulário de "primeiro ataque", "segundo ataque", "contenção estável", "escalada controlada" e "destruição mútua garantida", usado para vender as escaladas dos EUA na produção de armas nucleares, desde Kennedy e o falecido Robert McNamara (“the Missile Gap”) a Reagan (“Star Wars”).
De fato, como disse-me um veterano do Pentágono essa semana, "toda a questão nuclear, nos discursos do novo governo, está sendo reencenada, como reprodução mascarada da Guerra Fria e da Destruição Mútua Segura; tudo isso, a partir de um horrível processo de exagerar o perigo de uma ou duas bombas atômicas iranianas, que os persas provavelmente não têm competência para produzir e, com certeza quase absoluta, são incompetentes para detonar.”
A política "externa" de Biden e Clinton é feita, exclusivamente, de: (1) recriar a mesma velha Guerra Fria (com a 'novidade' de, hoje, a ameaça vir do Irã nuclear), pelas mesmas velhas razões: aumentar ao máximo o orçamento para a defesa doméstica; e (2) manter sem alteração os processos, já velhos de 60 anos, de apoiar o imperialismo israelense e pelas mesmas velhas razões pelas quais todos os presidentes, de Truman[3] a Bush Filho[4] (exceto talvez Eisenhower) sempre agiram: para atrair o dinheiro e os votos do lobby pró-Israel.
Em relação ao dinheiro, Obama fez exatamente o que todos sempre fizeram, e fê-lo sempre desde o início: no início da campanha, ao (a) aceitar o dinheiro das famílias Crown e Pritzker de Chicago; e no início do governo, ao (b) nomear Rahm Emanuel – primeiro nomeado de toda a equipe. (a) e (b) dificilmente serão movimentos desconectados um do outro.
Também desde o início da presidência, Obama trabalhou como caixeiro viajante do lobby israelense. A indicação de Mitchell e as mordidas-afagos sobre o fim das construções israelenses em território palestino foram cosméticas, ossos atirados ao número crescente de eleitores nos EUA indignados com a limpeza étnica na Palestina e a expulsão dos árabes da Terra Santa.
Obama tem, sim, estratégia coerente: manter o fluxo contínuo e crescente de dinheiro para a Defesa, mas sem fazer tanto barulho quando os 'antigos' fizeram contra os velhos inimigos de Guerra Fria (e.g. Rússia e Cuba).
O debate sobre o F-22 – até aqui o primeiro e único debate no qual Obama mostrou alguma firmeza – de modo algum é tentativa para conter gastos militares, posto que o orçamento para a Defesa, de fato, já aumentou; com o fim da fabricação do jato F-22, o dinheiro foi canalizado para fabricar o F-35, ainda mais destrutivo, e para ocultar que o presidente concorda com o orçamento da Defesa nos termos nos quais sairá do Congresso.
A brecha pela qual qualquer novo presidente pode introduzir alguma mudança significativa na política externa só permanece aberta por três meses, os primeiros de cada mandato, antes de que a oposição tenha tempo para organizar-se e firmar-se. Obama não usou a oportunidade e nomeou gente que nada queria ou quer ou algum dia quis, mudar, como Ross. Como sugerem as calculadas gaffes de Biden e Clinton, para não mencionar a arrogância teatral de Netanyahu e seus associados políticos, aquela pequena janela de oportunidades já está fechada.
Teria sido assim tão difícil sinalizar alguma mudança de rota? Não. De fato, não. Obama teria dado novo ânimo ao planeta se tivesse claramente abandonado as ideias do governo Bush expostas no documento “National Defense Strategy of the United States” em 2005, sobre a decisão de os EUA "atacarem preventivamente qualquer país "onde, quando e conforme os EUA considerem necessário". Como escreveu William Polk, conselheiro do Departamento de Estado para o Oriente Médio da era Kennedy, ano passado: "Enquanto aquele documento for o único projeto existente para a política externa dos EUA, o governo iraniano não cometerá a estupidez de desistir de fabricar sua bomba atômica".
Mas Obama, cercado defensores do expansionismo da Otan veteranos da era Clinton, e como bem claramente indica o seu discurso em Accra, empurrado pela via errada por uma visão inamovivelmente convencional sobre como o mundo funciona, está sendo derrotado pela pressão dos fatos. Primeiro, resgatou os grandes bancos. Depois, transferiu a guerra, do Iraque para o Afeganistão. Os grandes lobbies já sabem que Obama já está posto nos trilhos.
E aí estão os motins de Biden e Clinton, conduzidos a favor do lobby israelense e planejados para assumir o controle do governo tão logo a popularidade de Obama comece a cair. Quando foram publicados os resultados da última pesquisa Rasmussen presidencial, mostrando queda na popularidade de Obama, houve júbilo nos jornais em Telavive.
Além de tudo isso, é impossível subestimar a vaidade dos políticos. Biden é excepcionalmente vaidoso. É possível que acalente algum sonho louco de desafiar Obama nas eleições de 2012, impulsionado pelo dinheiro do lobby israelense que Biden consiga afastar de Obama.
E é possível que Clinton-marido esteja lembrando Clinton-secretária-de-Estado de que ele próprio chegou à Casa Branca em 1992 em boa parte porque o lobby israelense voltou-se contra George Bush Pai. O segundo princípio ensina que não existe política exterior, nem em governos democráticos nem em ditaduras – como se sabe pela "Lei de Thalheimer"
Por Alexander Cockburn, para o CounterPunch Diary
No plano superficial, Obama comanda uma equipe indisciplinada de governo; num plano mais realista (e mais sinistro), enfrenta motim comandado por duas figuras políticas que, há menos de um ano, não faziam outra coisa além de dizer e repetir o quanto suas pessoais qualificações para ocupar o Salão Oval seriam infinitamente superiores às do jovem senador de Illinois.
O grande perigo para Obama, que se vê bem evidente nas bombas-relógio (a metáfora é boa, porque são bombas-relógio políticas, não diplomáticas), não é nem o ridículo nem a confusão no plano internacional sobre quais, afinal, são as políticas de governo dos EUA. O perigo está no massacre direto e claro de sua presidência, por um lobby israelense doméstico que já está tão absolutamente fora de controle que já expõe hoje como ridícula a pífia tentativa de Obama para deter as construções nas colônias palestinas – ou para conter as agressões israelenses por qualquer outro meio.
Vejam Joe Biden, para começar. Há três semanas, deu luz verde a Israel para bombardear o Irã; foi suavemente admoestado pelo presidente. Na hora, foi como mais uma gaffe, numa vida de gaffes mais ou menos cômicas, perpetradas com intuito de autopromoção, para obter vantagem política pessoal.
Há mais do que isso, como se viu depois; tudo é mais grave. Imediatamente depois de Obama voltar de Moscou, o ar ainda adocicado na esperança de uma nova era de confiança e cooperação, Biden embarcou para Ucrânia e Geórgia, onde disse a economia russa estaria "atrofiada"[1] e não teria futuro. Em Tbilisi, disse no parlamento georgiano que os EUA continuariam a ajudar a Geórgia a "modernizar" o aparato militar; que Washington "apoia integralmente" a aspiração da Geórgia a unir-se à Otan; e que ajudaria Tbilisi a alcançar os padrões da aliança. As declarações geraram reações furiosas de Moscou, que exigiram sanções contra qualquer Estado que trabalhe para rearmar a Geórgia[2].
A Geórgia é fator importante – e pode ser fator vital – no caso de Israel decidir atacar o complexo nuclear iraniano.
A rota aérea de Israel ao Irã é geograficamente e diplomaticamente complicada. Por sua vez, a Geórgia está magnificamente bem situada como base de decolagem para esse tipo de aventura. Israel há muito tempo está profundamente envolvida em processos para rearmar e treinar forças armadas georgianas. O presidente Saakashvili tem-se vangloriado de que seu ministro da Defesa, Davit Kezerashvili, e Temur Yakobashvili, ministro responsável pelas negociações sobre a Ossétia do Sul, viviam em Israel antes de mudar-se para a Geórgia; e acrescentou: "A paz e a guerra estão nas mãos dos judeus israelenses."
Nos calcanhares de Biden em trabalho de proxeneta em Tbilisi, a secretária de Estado Clinton, por sua vez, tomou o rumo da Tailândia, para encontro com líderes asiáticos. Lá, em programa de televisão & amenidades, disse que "contra um Irã nuclear os EUA podem ter uma 'defesa guarda-chuva'" (de fato um 'guarda-chuva' nuclear para cobrir Israel, Egito e Arábia Saudita).
O lobby israelense tem trabalhado muito, já há alguns anos, para promover a ideia de um guarda-chuva nuclear dos EUA. O principal caixeiro-viajante desse negócio sempre foi Dennis Ross, hoje encarregado da política de Obama para o Oriente Médio, no Conselho Nacional de Segurança.
Em campanha, ano passado, Clinton várias vezes ofereceu a ideia de um 'defesa guarda-chuva' como exemplo de iniciativa política que ela – mas não Barack Obama, noviço em questões de negócios externos – teria competência para fazer avançar.
Sob qualquer ponto de vista racional, o "guarda-chuva nuclear" é ideia escabrosa, que cheira à teologia da era da alta Guerra Fria e ao vocabulário de "primeiro ataque", "segundo ataque", "contenção estável", "escalada controlada" e "destruição mútua garantida", usado para vender as escaladas dos EUA na produção de armas nucleares, desde Kennedy e o falecido Robert McNamara (“the Missile Gap”) a Reagan (“Star Wars”).
De fato, como disse-me um veterano do Pentágono essa semana, "toda a questão nuclear, nos discursos do novo governo, está sendo reencenada, como reprodução mascarada da Guerra Fria e da Destruição Mútua Segura; tudo isso, a partir de um horrível processo de exagerar o perigo de uma ou duas bombas atômicas iranianas, que os persas provavelmente não têm competência para produzir e, com certeza quase absoluta, são incompetentes para detonar.”
A política "externa" de Biden e Clinton é feita, exclusivamente, de: (1) recriar a mesma velha Guerra Fria (com a 'novidade' de, hoje, a ameaça vir do Irã nuclear), pelas mesmas velhas razões: aumentar ao máximo o orçamento para a defesa doméstica; e (2) manter sem alteração os processos, já velhos de 60 anos, de apoiar o imperialismo israelense e pelas mesmas velhas razões pelas quais todos os presidentes, de Truman[3] a Bush Filho[4] (exceto talvez Eisenhower) sempre agiram: para atrair o dinheiro e os votos do lobby pró-Israel.
Em relação ao dinheiro, Obama fez exatamente o que todos sempre fizeram, e fê-lo sempre desde o início: no início da campanha, ao (a) aceitar o dinheiro das famílias Crown e Pritzker de Chicago; e no início do governo, ao (b) nomear Rahm Emanuel – primeiro nomeado de toda a equipe. (a) e (b) dificilmente serão movimentos desconectados um do outro.
Também desde o início da presidência, Obama trabalhou como caixeiro viajante do lobby israelense. A indicação de Mitchell e as mordidas-afagos sobre o fim das construções israelenses em território palestino foram cosméticas, ossos atirados ao número crescente de eleitores nos EUA indignados com a limpeza étnica na Palestina e a expulsão dos árabes da Terra Santa.
Obama tem, sim, estratégia coerente: manter o fluxo contínuo e crescente de dinheiro para a Defesa, mas sem fazer tanto barulho quando os 'antigos' fizeram contra os velhos inimigos de Guerra Fria (e.g. Rússia e Cuba).
O debate sobre o F-22 – até aqui o primeiro e único debate no qual Obama mostrou alguma firmeza – de modo algum é tentativa para conter gastos militares, posto que o orçamento para a Defesa, de fato, já aumentou; com o fim da fabricação do jato F-22, o dinheiro foi canalizado para fabricar o F-35, ainda mais destrutivo, e para ocultar que o presidente concorda com o orçamento da Defesa nos termos nos quais sairá do Congresso.
A brecha pela qual qualquer novo presidente pode introduzir alguma mudança significativa na política externa só permanece aberta por três meses, os primeiros de cada mandato, antes de que a oposição tenha tempo para organizar-se e firmar-se. Obama não usou a oportunidade e nomeou gente que nada queria ou quer ou algum dia quis, mudar, como Ross. Como sugerem as calculadas gaffes de Biden e Clinton, para não mencionar a arrogância teatral de Netanyahu e seus associados políticos, aquela pequena janela de oportunidades já está fechada.
Teria sido assim tão difícil sinalizar alguma mudança de rota? Não. De fato, não. Obama teria dado novo ânimo ao planeta se tivesse claramente abandonado as ideias do governo Bush expostas no documento “National Defense Strategy of the United States” em 2005, sobre a decisão de os EUA "atacarem preventivamente qualquer país "onde, quando e conforme os EUA considerem necessário". Como escreveu William Polk, conselheiro do Departamento de Estado para o Oriente Médio da era Kennedy, ano passado: "Enquanto aquele documento for o único projeto existente para a política externa dos EUA, o governo iraniano não cometerá a estupidez de desistir de fabricar sua bomba atômica".
Mas Obama, cercado defensores do expansionismo da Otan veteranos da era Clinton, e como bem claramente indica o seu discurso em Accra, empurrado pela via errada por uma visão inamovivelmente convencional sobre como o mundo funciona, está sendo derrotado pela pressão dos fatos. Primeiro, resgatou os grandes bancos. Depois, transferiu a guerra, do Iraque para o Afeganistão. Os grandes lobbies já sabem que Obama já está posto nos trilhos.
E aí estão os motins de Biden e Clinton, conduzidos a favor do lobby israelense e planejados para assumir o controle do governo tão logo a popularidade de Obama comece a cair. Quando foram publicados os resultados da última pesquisa Rasmussen presidencial, mostrando queda na popularidade de Obama, houve júbilo nos jornais em Telavive.
Além de tudo isso, é impossível subestimar a vaidade dos políticos. Biden é excepcionalmente vaidoso. É possível que acalente algum sonho louco de desafiar Obama nas eleições de 2012, impulsionado pelo dinheiro do lobby israelense que Biden consiga afastar de Obama.
E é possível que Clinton-marido esteja lembrando Clinton-secretária-de-Estado de que ele próprio chegou à Casa Branca em 1992 em boa parte porque o lobby israelense voltou-se contra George Bush Pai. O segundo princípio ensina que não existe política exterior, nem em governos democráticos nem em ditaduras – como se sabe pela "Lei de Thalheimer"
*. A política – qualquer política – é sempre doméstica.
Fonte: Vermelho
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