sábado, 24 de outubro de 2009

Esquerda é favorita nas eleições gerais do Uruguai

AMÉRICA LATINA

24 DE OUTUBRO DE 2009 - 14H27
Mujica

O candidato de esquerda à presidência do Uruguai, Jose Mujica, discursa em Montevidéu

O Uruguai realiza neste domingo eleições presidenciais e para renovar o Congresso, nas quais o aspirante da coalizão governista de esquerda Frente Ampla, o ex-guerrilheiro José "Pepe" Mujica aparece como favorito, embora pesquisas antecipem a possibilidade de um segundo turno com o ex-presidente liberal Luis Lacalle (1990-95).

Mujica esteve 14 anos preso por sua participação na guerrilha. Para afastar desentendimentos, sobretudo no setor empresarial, escolheu como vice Anilo Astori, de perfil mais moderado.

Pesquisas divulgadas poucas horas antes do encerramento da campanha, à meia-noite de quinta-feira, anteciparam 45,5% a 46% dos votos para Mujica e entre 27% e 30% para Lacalle, aspirante do Partido Nacional (PN, centro-direita); no total, estão registrados 2.584.219 eleitores.

O candidato do Partido Colorado, Pedro Bordaberry, filho do ex-ditador Juan Bordaberry (1973-1976), receberia entre 13% e 14% dos votos, o candidato do Partido Independente Pablo Mieres entre 2% e 3%, enquanto os indecisos se situam entre 6% e 9%; os demais votos se dividem entre a Assembleia Popular (esquerda), e votos em branco e nulos.

Mujica e seu companheiro de chapa, o ex-ministro da Economia Astori, estabeleceram um pacto nacional para estimular políticas de Estado voltadas para a educação, a energia, o meio ambiente e a segurança pública.

O Partido Nacional, principal formação de oposição, se declarou disposto a um pacto nacional, mas criticou a proposta da FA a poucos dias das eleições.

O candidato a vice-presidente do PN, Jorge Larrañaga, disse que a iniciativa é "muito pouco crível, muito feita para a tribuna, muito próxima à instância eleitoral", mas destacou que o PN "está disposto a um pacto nacional".

Pedro Bordaberry, o candidato à presidência mais jovem da eleição de 25 de outubro, com 49 anos, representa uma renovação do tradicional Partido Colorado e uma mudança de geração no Uruguai, com projetos pragmáticos.

Nascido em Montevideu em 28 de abril de 1960, o advogado Bordaberry se afastou do exercício da profissão no início deste ano para se dedicar por inteiro à carreira política, que havia começado no início da década de 90.

Exerceu cargos nos ministérios da Indústria, Energia e Minérios, e de Turismo e Esporte, e ostentou a titularidade de ambas as pasta durante o governo colorado de Jorge Batlle (2000-2005).

Após a derrota nas eleições de 2004 do Partido Colorado, com 10% dos votos após ser o principal ator da política uruguaia por mais de um século, Bordaberry se apresentou como candidato à prefeitura de Montevidéu nas municipais de maio de 2005, conseguindo 27% dos votos. Agora, busca uma boa votação nacional.

O atual e primeiro presidente de esquerda do Uruguai, Tabaré Vázquez, conta, ao final de seu mandato,, com mais de 60% de aprovação popular, com um balanço favorável nas áreas econômica, social e militar, mas com uma política externa sem muito vigor e um fracasso no campo da segurança.

O cientista político Adolfo Garcé afirmou à AFP que do ponto de vista da administração da economia, o governo usufruiu da boa conjuntura econômica internacional que durou até a crise global, e o Uruguai foi um dos poucos países do mundo a não sofrer recessão.

O analista Juan Carlos Doyenart considera que o governo de Vázquez, que entregará o poder no dia 1º de março ao vencedor das eleições de 25 de outubro - que pode ser decidida em segundo turno em 29 de novembro - teve "uma administração acertada da macroeconomia, o que permitiu aproveitar a conjuntura".

Os dois destacaram as políticas sociais de combate à pobreza e redução do desemprego. O índice de pobreza caiu de 26% em 2007 a 20,5% em 2008, enquanto a indigência passou de 2% a 1,5%, segundo o Instituto Nacional de Estatística.

Mujica: esquerda que não renuncia à utopia

O ex-guerrilheiro tupamaro José "Pepe" Mujica, 75 anos, conhecido pela aparência humilde é taxado pela imprensa como alguém que não tem "papas na língua", o que para seus apoiadores nada mais é do que demonstração de uma personalidade forte,que não abre mão das idéias que defende. Ele carrega em sua candidatura a promessa de levar ao poder uma esquerda popular, honesta e que não renuncia à utopia.

Ex-ministro e senador, Mujica, que tem como hobby o cultivo de flores e hortaliças em sua fazenda em Montevidéu, tentará fazer a coalizão de esquerda Frente Ampla renovar, por mais cinco anos, seu primeiro mandato à frente do Executivo uruguaio.

Nascido em Montevidéu e filho de um casal de ascendência basca e italiana, o candidato governista demonstrou cedo seu interesse pela política. Já nos tempos de escola, ele era "meio anarquista", segundo o livro "Mujica", de Miguel Ángel Campodónico. No entanto, os primeiros anos de militância do ex-rebelde foram no conservador Partido Nacional (Blanco), seu principal adversário na votação deste domingo.

Só depois de alguns anos é que Mujica mudou de rumo e se juntou aos guerrilheiros do Movimiento de Libertação Nacional-Tupamaros (MLN-T). Devido à sua condição de rebelde, ele passou mais de 13 anos preso durante o regime militar que governou o Uruguai de 1973 a 1985.

A sombra desse passado turbulento, unida a seu estilo heterodoxo, transformam o candidato governista em uma figura de grande apelo midiático.

Um dos episódios mais polêmicos desde que Mujica foi escolhido candidato nas prévias da Frente Ampla, em junho deste ano, foi a publicação do livro "Pepe - Coloquios", do jornalista Alfredo García. Nesta obra, Mujica se refere à Argentina como um país com "reações de histeria, loucura e paranoia".

As declarações do uruguaio estremeceram, no primeiro momento, suas relações com a presidente argentina, Cristina Fernández de Kirchner, e o marido desta, Néstor Kirchner. Mas depois houve uma reconciliação e Mujica fez um pedido público de desculpas.

A repercussão foi grande porque ambos chegaram a manifestar seu apoio a Mujica, que parece mais preocupado em associar sua imagem à do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, sua principal referência política na região.

Após o episódio, o candidato admitiu em seu blog a importância de saber ficar calado, consciente de que suas derrapadas lhe valeram críticas tanto da oposição como dentro da própria Frente Ampla, onde dirigiu durante anos o Movimento de Participação Popular (MPP), grupo majoritário na coalizão.

No entanto, o estilo afiado e direto deste ex-ministro da Pecuária (2005-2008) é avaliado de forma positiva por muitos de seus eleitores, especialmente pelos jovens e pelas classes operárias e mais desfavorecidas, que veem em Mujica uma espécie de Robin Hood da política, capaz de questionar o sistema.

Ciente dos riscos desta imagem, nos últimos meses Mujica se preocupou em transmitir tranquilidade às classes média e alta do país. Já aos empresários e investidores, prometeu um Governo bem parecido com o de seu colega de partido e atual presidente, Tabaré Vázquez.

Mais comedido e moderado, Vázquez, no entanto, várias vezes deixou transparecer suas diferenças em relação a Mujica. Nas prévias da Frente Ampla, por exemplo, ele apoiou o ex-ministro da Economia Danilo Astori, que acabou virando vice na chapa governista após complexas negociações.

Caso não se eleja, Mujica garantiu que vai deixar a política e se dedicar plenamente à manutenção da fazenda que possui nos arredores de Montevidéu, onde vive há anos com a senadora Lucía Topolanski, com quem se casou em 2005.

A relação dos dois começou em 1972, quando, na guerrilha, o candidato se envolvida em assaltos e sequestros, atividades que renderam a ele sete ferimentos a bala.

Com o retorno da democracia e beneficiado por uma lei de anistia, o ex-tupamaro passou a se dedicar à política, à antropologia e à literatura, três de suas paixões.

Mujica, que aparece em primeiro em todas as pesquisas, pretende instalar no Uruguai um governo "honesto", de "lutadores sociais, com a cabeça fria, o coração quente" e "as bandeiras da utopia bem altas".

Fonte: AFP
Retirado do Portal Vermelho

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