Na véspera do Natal, o New York Times publicou uma conclamação à guerra: “Só há um meio para deter o Irã”, escreveu Alan J. Kuperman, e é “atacar militarmente as instalações nucleares do Irã” (NYT, 24/12/2009, em Nytimes.
Por Paul Craig Roberts, para o Counterpunch
Kuperman é apresentado como “diretor do Programa de Prevenção da Proliferação Nuclear da Universidade do Texas em Austin”, mas sua conclamação à guerra de véspera de Natal é trabalho contraditório e desinformado, sem qualquer traço de análise acadêmica objetiva.
Por exemplo, Kuperman contradiz o relatório de 16 agências norte-americanas de segurança, todos os relatórios da Agência Internacional de Energia Atômica e da inteligência russa que, todos, já demonstraram que o Irã não tem qualquer tipo de programa de fabricação de armas nucleares. Por espantoso que pareça, não passou pela cabeça de Kuperman que os leitores estranhariam muito que um burocrata professor em Austin, Texas, tivesse acesso a informação melhor do que a informação com a qual trabalharam todas aquelas autoridades, especialistas, profissionais etc.
Kuperman está tão cegamente decidido a bombardear o plano do presidente Obama de conseguir que outros países enriqueçam o urânio de que o Irã necessita para seu programa de energia nuclear e isótopos para uso médico, que escreve inúmeros desatinos. Depois de declarar que o Irã tem “um programa para a bomba”, Kuperman declara que “o urânio iraniano contém impurezas” e que a ameaça de Ahmadinejad de que “enriquecerá domesticamente o seu urânio a 20%” seria blefe, porque mesmo que o Irã conseguisse enriquecer muito o seu urânio cheio de impurezas, “não conseguiria converter o urânio em elemento combustível.” Desatinos e desatinos.
O que teria passado pela cabeça do jornalista-editor dos colunistas do New York Times quando aprovou para publicação o artigo de Kuperman? O Irã, escreve Kuperman, precisa de “urânio enriquecido a 90%” para fabricar armas, mas não pode enriquecer o urânio até 20% e tampouco saberia fabricar combustível... Sendo assim… como o Irã fabricaria alguma bomba? Sim, Kuperman escreve que “chegamos ao ponto em que ataques aéreos são a única escolha com alguma chance de impedir que o Irã construa armas nucleares. Quanto antes os EUA atacarem, melhor.”
Nada poderia deixar mais claramente evidente que, como aconteceu na invasão dos EUA ao Iraque, nenhum ataque ao Irã tem ou algum dia terá algo a ver com armas de destruição em massa. A ‘bomba iraniana’ é apenas mais um ganso dentro do qual se oculta uma agenda não declarada.
De onde terão saído as credenciais de Kupermann relativas a alguma ‘não-proliferação’? De que modo, um ataque militar ensandecido contra um país soberano ajudaria alguma ‘não-proliferação’? Os EUA não estarão, agora, à custa de publicar sandices sobre ameaças atômicas e atos de guerra, muito mais próximos de estimular países a construir armas nucleares, do que trabalhando por alguma não-proliferação?!
Ao final da primeira década do século 21, os EUA estão em guerra no Iraque, onde a antiga comunidade cristã-caldeia foi destruída – não por Saddam Hussein, mas pela invasão ilegal do Iraque inventada pelos neoconservadores norte-americanos –, que também já atacaram o Afeganistão, o Paquistão, o Iêmen e o Sudão. E os EUA iniciaram outra guerra, que imediatamente perderam, entre seu governo-fantoche na província ex-soviética da Geórgia, e a Rússia.
Os EUA, o maior disseminador de terrorismos e terroristas do mundo, é o principal financiador de grupos terroristas que organizam ataques dentro do Irã. Foram dinheiro, armas e cobertura diplomática norte-americanos que tornaram possíveis os crimes de guerra que Israel cometeu contra o povo libanês em 2006, e contra civis palestinos em Gaza em 2008-2009 – esses, fartamente documentados e comprovados no Relatório Goldstone.
O Irã jamais interveio em assuntos internos dos EUA, mas os EUA têm longuíssimo currículo de intervenções em assuntos internos do Irã. Em 1953, os EUA derrubaram Mohammed Mosaddeq – primeiro-ministro iraniano muito popular, para lá instalar um governo-fantoche que torturou e matou iranianos que lutavam pela independência política de seu país.
Apesar dessa e de outras ofensas dos EUA ao Irã, Ahmadinejad tem repetido incansavelmente que o interesse do Irã é viver em boas relações com os EUA – e tem sido repetidamente repelido. Os EUA trabalham exclusivamente para entrar em guerra contra o Irã, porque essa guerra parece necessária para expandir a hegemonia dos EUA no mundo.
Seria de esperar que um especialista em não-proliferação considerasse a história; Kuperman fracassa nesse quesito. Kuperman tampouco diz algo sobre as armas atômicas de Israel, Índia e Paquistão. Diferentes do Irã, nenhum desses países é signatário do Acordo de Não-proliferação de Armas Nucleares. Israel, Índia e Paquistão desenvolveram em segredo suas bombas atômicas, e muitos especialistas creem que, no caso de Israel, houve colaboração ativa dos EUA – o que configura ato de traição. Esses três países têm recebido incontáveis recompensas de Washington, apesar da perfídia. Por que Kuperman tanto se preocupa com o Irã, que abriu suas portas aos inspetores da Agência Int ernacional de Energia Atômica, mas não se preocupa com Israel, país que jamais permitiu qualquer tipo de inspeção, nem uma, que fosse?
A resposta é que o lobby israelense, o complexo militar e de segurança dos EUA e os sionistas ‘cristãos’ já conseguiram demonizar o Irã. Todos os especialistas sérios sabem que nenhuma bomba atômica iraniana jamais teria qualquer serventia além de proteger o Irã contra ataques. Desde que os EUA perderam o monopólio das armas atômicas, depois de usá-las ofensivamente e sem qualquer propósito contra um Japão derrotado, as armas atômicas só servem como arma de contenção.
Os EUA não têm qualquer conflito de interesse econômico com o Irã. O Irã é simples fornecedor de petróleo – fornecedor importante, sim. Um ataque dos EUA contra o Irã, como prega Kuperman, teria como principal efeito a suspensão do fluxo de petróleo que chega ao ocidente pelo Estreito de Hormuz. Seria bom para as empresas de refino, que vendem gasolina ao Ocidente a preços exorbitantes, mas, exceto esses, ninguém mais teria qualquer ganho.
Não bastasse o grito de guerra de Kupermann, também há congregações de falsos cristãos, que também querem guerra. Grande número deles, organizados não se sabe por quem nem com que dinheiro, sob o rótulo de “Líderes Cristãos por um Irã Desnuclearizado” [ing. “Christian Leaders for a Nuclear-free Iran”] escreveram ao Congresso dos EUA exigindo sanções contra o Irã que, de fato, são também atos de guerra. Na lista aparece o sionista ‘cristão’ John Hagee, o qual, dizem os jornais, denigre Jesus Cristo e prega à sua Congregação que é desejo de Deus que os norte-americanos lutem e morram por Israel, opressor do povo palestino.
Dentre os signatários da moção que exige ato de guerra imediato contra o Irã, estão Pat Robertson, presidente da Rede de Comunicação Cristã [ing. Christian Broadcasting Network], o criminoso da era-Nixon Chuck Colson, e Richard Land, presidente da Comissão de Ética e Liberdade Religiosa da Convenção Batista Sulista. Obviamente, “ética”, para os batistas sulistas significa assassinar islâmicos; e liberdade religiosa exclui todos que não sejam sionistas “cristãos”.
Não falta quem considere perfeitos idiotas esses idiotas que se dizem cristãos. Contudo, esses idiotas controlam a opinião e o voto de dezenas de milhões de norte-americanos. Há, de fato, mais desses idiotas, do que cristãos norte-americanos inteligentes, morais, bem informados. O voto dos idiotas prevalecerá.
Na segunda década do século 21, haverá expansão das guerras dos sionistas norte-americanos contra o Islã. E as guerras que os EUA farão a serviço da expansão territorial de Israel selarão a completa bancarrota dos EUA. Não haverá quem se interesse por comprar os bônus do Tesouro para financiar os descomunais déficits do governo dos EUA. E os bônus serão monetarizados pelo Federal Reserve. A inflação subirá como foguete. A inflação destruirá o dólar como moeda mundial de reserva, e os EUA não terão como pagar pelas próprias importações. Começarão os racionamentos, também de comida e gasolina, e os “EUA Superpotência” descobrir-se-ão apertados contra a parede, como país de terceiro mundo que não consegue pagar o que deve.
Os EUA desceram ao fundo do poço, tanto economicamente quanto moralmente, de tanto obedecer ao lobby israelense. Até Jimmy Carter, ex-presidente dos EUA e governador da Georgia teve recentemente de pedir perdão ao lobby israelense, depois de ter honestamente criticado o tratamento desumano que Israel dá aos palestinos nos territórios ocupados, porque, se não pedisse perdão, seu neto seria impedido de candidatar-se a uma cadeira no Senado do estado da Georgia. Aí está um fato que deveria mostrar aos machões da ‘superpotência’ norte-americana quem manda, de fato, nos EUA.
Fonte: Vi O Mundo / Vermelho
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